A intenet se tornou uma caixa de ressonância do discurso de ódio
Dos comentários em sites de notícias às reportagens nas redes sociais,a intenet está repleta de discursos inflamados.O fenômeno da democratização da informação foi acompanhado de um problema que tomou conta da rede:o ódio.Hate speech e cyberhate são dois novos termos no glossário cibernético.
Seja no mundo virtual ou fora dele,o discurso de ódio envolve todas as formas de expressão que incitam,promovem ou justificam a intolerância ou violência contra minorias étnicas,religiosas ou qualquer outro grupo de pessoas.
O ódio produz indiferença,desprezao,depreciação,e pode chegar ao extremo da perseguição e tentativa de destruição.Quem odeia muitas vezes não se conforma em apenas discordar,mas chega ao ponto de não tolerar a existência da própria pessoa que pensa diferente.
No tempo em que vivemos,a compreensão da liberdade de expressão religiosa tem se tornado ambígua.Ora é entendida como um fim em si mesma,ora como um meio para um fim mais nobre e maior (Civil Liberties,Greenhaven Press,2004,p. 22,23).A liberdade de expressão religiosa é um direito-dever que proíbe a pessoa de praticar discurso de ódio ao mesmo tempo em que a protege de não ser vítima desse tipo de conduta.
Além de ferirem as constituições democráticas,bem como os tratados internacionais de direitos humanos,tanto o discurso quanto a sua causa - o sentimento de ódio - são incompatíveis com os valores e princípios bíblicos (Levítico 19:17,18; Prov3rbios 10:12, 15:17, 26:24-26; Lucas 6:27-31; Gálatas 5:19-21; 1João 2:9-11, 3:13-15, 4:20).Ellen White,uma das fundadoras da Igreja Adventista,escreveu que o amor de Deus "é um princípio positivo e ativo,uma fonte viva,manando sempre para beneficiar os outros.Se o amor de Cristo habita em nós,não somente não nutriremos nenhum ódio contra nossos semelhantes,mas buscaremos por todos os modos manifestar-lhes amor" (Mente,Caráter e Personalidadenv.1, p. 249).Por isso,devemos defender,incentivar e orientar as pessoas a manifestar opiniões dentro dos limites da tolerância e do respeito às pessoas e instituições.
Evidentemente,nem todas as falas e expressões que soam ofensivas podem ser consideradas discurso de ódio.Por isso,há que se considerar a intenção,o modo e os resultados do que é dito ou expresso.Infelizmente,o que se vê em muitos casos é a intenção deliberada de atacar outros mediante o uso de palavras ou gestos caracterizadamente violentos.O discurso de ódio precisa ser combatido,mas,por outro lado,não pode se tornar pretexto para uma mordaça velada à expressão de ideias-religiosas ou não-que incomodam ou provocam desconforto em outros.Em uma sociedade democrática,opiniões contrárias precisam ter sua expressão garantidas no âmbito do respeito e da civilidade.Exercidas sem incitação à intolerância e suas formas de violências,elas não podem,de maneira alguma,ser prejudicadas ou tolhidas.
Mas se,de um lado,é verdade que todos que amam a liberdade deveriam encorajar a liberdade de expressão,também é verdade que tal liberdade precisa ser vivenciada no contexto do amor a Deus e ao próximo,do respeito à leis e do esforço engajado para a construção de uma sociedade mais íntegra,justa e solidária.Esse tipo de liberdade de expressão ensinado pelo cristianismo e apoiado pelos adventistas do sétimo dia está na contramão do discurso de ódio.
Carlos Flávio Teixeira é mestre em Direito Constitucinal,doutor em Ciências da Religião e pós-doutor em Teologia Bíblico-Sistemática